Cine Retrô: Monty Python em O Sentido da Vida

para Daniel Guichard, especulador do sentido da vida

Em outubro de 1969 era inaugurado na TV britânica um novo programa de humor, que contava com talentos como John Cleese, Michael Palin, Graham Chapman, Eric Idle e Terry Jones, e que contava com a colaboração de Terry Gilliam nas vinhetas e por vezes, em frente às cameras também. Foi um tremendo sucesso durante as suas quatro temporadas, mas os caras se cansaram e resolveram parar de fazer televisão. Provavelmente eles não sabiam, mas naquela altura eles já eram lendas. O grupo, a quem deram o nome de Monty Python, fez as temporadas da TV e acharam que o formato estava desgastado. O que não os impediu de invadir o cinema, e para a nossa sorte, também com muito sucesso. Fizeram apenas três filmes. Poucos, mas todos viraram clássicos do humor surrealista e inteligente, e abriram as portas para o humor non-sense e irônico vindo da terra da Rainha. Começaram em 1975 com “Em Busca do Cálice Sagrado“, seguido de “A Vida de Brian” em 1979 e por fim, o último trabalho de todos juntos, este que comento agora, “O Sentido da Vida“.

Ao contrário dos anteriores, que tinham uma história e personagens definidos, este filme traz o formado de esquetes, que usavam na TV, contando várias histórias para tentar explicar o motivo da Existência. No fim das contas o filme fala de tudo, menos do sentido da vida propriamente, o que não é nada nada ruim. Não acho que possa ser comparado ao segundo filme deles, que tira sarro do messianismo e da adoração fanática dos religiosos, ou mesmo o primeiro onde sacaneiam a lenda do Rei Arthur (vale lembrar que esses assuntos são quase sagrados na Inglaterra). Mas “O Sentido da Vida” é um humor verborrágico, de sacadas inteligentissimas, mesmo que irregular; há quadros brilhantes como a familia católica com problemas de procriação, que acaba caindo em um dos números musicais mais divertidos do cinema, onde aparece a música “Every Sperm is Sacred”, indicada ao BAFTA de melhor canção original, isso sem falar do Sr. Creosote, da Máquina que Faz Ping, a aula de educação sexual, o momento da morte, as animações em estilo pesadelo de Terry Gilliam, entre outros atrativos. Para quem não conhece, falando assim parece bem desinteressante ou mesmo sem graça, mas acredite: poucas coisas no mundo são mais engraçadas do que esses caras.

Não é uma comédia que todos possam gostar. É preciso muita atenção para perceber a crítica à sociedade em geral e às frescuras britânicas, e à maneira com a qual eles enxergam a vida, a morte e coisinhas relacionadas. Aqueles que gostam de besteirol, comédia escrachada e que gera muita vergonha alheia, passem longe do filme que, aliás, venceu o Grande Prêmio do Júri em Cannes. Infelizmente não se faz mais humor à moda Python, mesmo que praticamente todos os humoristas e grupos que vieram depois tenham se inspirado neles. E seus integrantes, bem… Cleese hoje em dia faz qualquer filme que caia em suas mãos, Chapman morreu, Palin tem um programa de viagem pelo mundo, Idle escreve teatro, Jones escreve livros sobre história e Gilliam é cineasta consagrado (sendo que antes do filme em si há um curta dirigido por ele, com a sua visão da vida, e que é muito divertido, por sinal) sendo o diretor do recente “O Imaginário do Doutor Parnassus“, último filme de Heath Ledger. Cada um tomou o seu rumo, como se vê. Mas a obra que fizeram juntos marcou para sempre a maneira de se fazer comédia, o humor nunca mais foi o mesmo depois deles.

*Hoje não mostro o trailer, mas um esquete retirado do segundo ato do filme, o musical “Every Sperm is Sacred”, para exemplificar o estilo do humor do filme; infelizmente não há legendas, mas ainda assim é muito bom. ;D